Fazenda onde nasceu o blogueiro. Foto Luis Fernando Gomes

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domingo, 23 de junho de 2013

Cenas Nada Evangélicas.


CENAS NÃO MUITO EVANGÉLICAS.

Mário Cleber da Silva


Naquele tempo estava Jesus passeando com seus apóstolos pelas poeirentas estradas de Jericó – o asfalto prometido nas últimas eleições ficara só no papel - , todo distraído, acessando as Redes Sociais no smartphone de última geração que tinha ganho de Marta como presente de Natal,  isto é , no seu aniversário, quando o barulho de uma multidão que vinha atrás dele lhe chamou a atenção. Perguntou a um dos doze:
- Quem são eles? É a Marcha para Jesus? Ou é a Marcha das Vadias?
- O Senhor está atenado, hein? Mas se enganou. São os operários desempregados pelo corte que as grandes companhias estão fazendo e algumas empregadas domésticas que ficaram desempregadas depois do Pec das Domésticas  e um monte de gente protestando contra o aumento de 20 centavos nas carruagens.– falou sucintamente um dos supracitados doze.
- Protestantes? – falou Ele. – Oh, Jeová, estes vão me dar trabalho no futuro. Mas eles devem estar com fome – retorquiu o Mestre, consultando o relógio que, felizmente, os trombadinhas ainda não tinham roubado, e que ele tinha comprado no Shopping Oi. – Ainda bem que aqui é o Rio Jordão e não Rio de Janeiro – ironizou (coisa rara, diga-se a bem da verdade). – O que eles trouxeram para comer?
- E eles têm dinheiro para trazer “matula” ou “quentinha”?: Não disse que estão desempregados? – falou o apóstolo que não estava em seus melhores dias.
- E os protestantes? (Havia uma certa obsessão com estes) Precisamos dar-lhes de comer. O que tem aí neste embornal? – A voz de Jesus era doce como o mel.
- Isto não é embornal, é cesta biodegradável que os supermercados estão enfiando goela abaixo dos consumidores e cobrando um absurdo (este apóstolo ainda vai criar confusão, meu Deus). E não tenho nada aqui, não. Tem um bóia fria aqui de Minas, que trabalha na colheita de café que trouxe  uma cesta com uns pães e peixes, mas só um milagre para dar de comer a esta multidão toda com estas coisicas...
- Milagre maior é mineiro trazer peixe. Lá não tem mar. Se fosse queijo.
- Hello, hello – o apóstolo fungou – Rio, pelo menos, tem. Rio São Francisco nasce lá.
Nunca estudou geografia?
- Esquece – falou ele docemente -. Distribua isto para o povo.
-Esta cesta básica?
- Ô, apóstolo – agora ele perdeu a paciência – tenho barba mas não sou o Lula. É para distribuir o que está dentro da cesta.
Sem retrucar, o apóstolo chamou os coleguinhas e foram distribuir o que tinha na cesta e  de onde milagrosamente não paravam de sair peixe e pão. Entretanto ouviu-se um zumzum no meio do povo.
- O que foi? -  perguntou o mestre antes de atender uma chamada no celular, era o Papa Francisco, mas aquele argentino podia esperar. – Estão reclamando?
- Estão querendo saber se o pão não tem produtos químicos cancerígenos para crescer tanto assim?
- Homens e mulheres de pouquíssima fé. E ingratos.
- Perguntaram se não tem ovo de chocolate para sobremesa ou goiabada.
- Ovo de chocolate só na Páscoa – falou Ele com tristeza naqueles olhos azuis, parecendo artista americano, fazendo o papel de Cristo, sabendo que a Páscoa significava sua morte. – Mas, reparando em alguns homens ao  longe, indagou: E aqueles lá? Por que não comem? Estão nervosos?
- São vendedores de cachorro quente e de coca cola. O senhor tirou o pão deles (riu por dentro o apóstolo com o trocadilho). Estão querendo saber se o senhor pagou a taxa de licenciamento da prefeitura, se a Fifa permitiu que o senhor desse, no lugar de vender, este lanche e se foi com a autorização da Presidenta.
- Presidente!!! – corrigiu o Mestre.
- Shshshsh –  o apóstolo  fez o sinal da cruz – Cuidado senão ela te prende e a Páscoa vai ser antes da hora (hihihhihihi- voltou a rir o desgraçado,  por dentro).
- Não se pode contentar a todos, nem gregos nem troianos, nem árabes e nem judeus, nem petistas nem tucanos. Oba , rimou. . Mesmo assim ainda vejo gente sem comer...
- Isto não é, nem foi e nem será novidade – retrucou Judas, que até o momento ficara calado.
- Não estou falando do futuro, Judas. Falando em futuro o seu será ...
- Olha lá, olha lá, como fala. É politicamente incorreto dar cor ao futuro.
Jesus engoliu em seco, para não explodir (tinha  certa implicância com Judas, confessava. Seria a barba? O gosto dele por dinheiro? A boca? Já  imaginou ele dando um beijo? Hum..). Controlando-se, continuou.
- Não falo do futuro, mas de agora, neste momento. No hic et nunc. Tem gente que ainda não está comendo.
- É porque eles acham que “quando a esmola é muita o santo desconfia”
- Onde você aprendeu isto? – estava curioso.
- No álbum “Como diz o ditado”, da Mônica, do Maurício de Sousa. Acabei de comprar o álbum para minhas sobrinhas. Custou 33 moedas.
(Judas era um bom sujeito, pensando nas sobrinhas. Preciso mudar minhas idéias sobre ele.)
De repente um montueiro de gente, uma confusão danada, uma balbúrdia, uma algaravia. Pensaram ser até passeata de estudantes, ou mesmo grevistas, ou mais gente reclamando do aumento de 20 centavos nas passagens de ônibus no Brasil.. Mas nada disto. Era um jovem rico que queria se aproximar de Jesus e estava atropelando todo mundo para chegar até o mestre. Quando conseguiu ficar cara a cara com ele, perguntou:
- Mestre, o que devo fazer para ganhar a vida eterna?
Jesus, que não era bobo,  nem nada, já sabia quem era, foi respondendo com uma pergunta:
-Já fez a declaração de imposto de renda este ano?
- Sim.

- Então, se você fez a declaração direitinho, e não sonegou, você vai alcançar a vida eterna, pois com este Leão do Imposto de Renda tão bravo e tão exigente, não existirá ninguém que não alcance o céu.

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