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Philippa Roxby - BBC News .
Não há pai quem não tenha, ao menos uma vez na vida, sido
ignorado por uma criança, que prefere continuar assistindo à TV, jogando
videogame ou brincando com o celular a acatar as ordens recebidas.
Porém, esse comportamento, capaz de tirar qualquer um do sério,
pode não ser proposital, mas estar relacionado à forma como os cérebros dos
pequenos se desenvolvem.
É
o que sugere uma série de pesquisas realizada por cientistas britânicos, para
quem as crianças não ignoram solenemente os adultos, mas sofrem do que eles
chamam de "cegueira não intencional".
"Pais e professores devem entender que até quando focam em
coisas simples, as crianças têm menor percepção do que está ao redor delas, em
comparação com os adultos".
"Uma criança tentando fechar o zíper do casaco enquanto
cruza a rua, por exemplo, pode não ser capaz de prestar atenção no tráfego de
automóveis, enquanto um adulto com plenas faculdades mentais não teria problema
nenhum em exercer esses dois movimentos simultaneamente", acrescenta
Lavie.
"Em resumo, a capacidade de percepção do que está fora do
foco de atenção se desenvolve com a idade. Dessa forma, crianças menores têm
maior risco de sofrer o que chamamos de 'cegueira não intencional'",
conclui a cientista.
A constatação de Lavie é baseada em um experimento que ela
conduziu recentemente para testar os níveis de "cegueira não
intencional" em crianças e adultos.
Lavie pediu a mais de 200 visitantes do Museu de Ciência de
Londres para escolher a linha mais longa de uma tela com sete exemplos
diferentes.
Em uma das telas, um quadrado preto piscava e, em seguida,
participantes tinham de responder se viram a figura.
Enquanto 90% dos adultos foram capazes de perceber a presença do
quadrado durante praticamente todo o tempo, menos de 10% das crianças abaixo de
10 anos detectaram o objeto.
Já crianças de 11 a 14 anos demonstraram uma maior capacidade de
percepção, enquanto essa aptidão diminuía à medida que a dificuldade da tarefa
aumentava.
Essa descoberta surpreendeu Lavie.
"Nas crianças, o córtex visual primário não respondia ao
objeto presente na tela e isso parece se desenvolver com a idade, até os 14
anos e depois disso também. Mas eu não esperava que crianças mais velhas também
sofressem de 'cegueira não intencional'. Seria interessante ver até que ponto
esse comportamento se desenvolve".
Pesquisas anteriores em cérebros de adultos sugerem que o córtex
visual primário é a parte do cérebro responsável pela percepção dos objetos.
Pacientes que sofreram algum tipo de dano nessa região tendem a experimentar
menor noção periférica.
Há, também, implicações óbvias do desenvolvimento tardio desse
comportamento. Digitar no celular ao cruzar uma rua, por exemplo, se torna
muito mais perigoso se tal percepção não estiver totalmente desenvolvida, por
exemplo.
Vantagens
'Cegueira intencional' nos ajudaria a concentrar, argumentam
cientistas
Mas há um lado positivo na cegueira não intencional.
Quem quer ser distraído por tudo e por todos? Certamente a falta
de consciência periférica significa que podemos reter nosso foco e concentrar.
Psicólogos argumentam que todos temos uma capacidade limitada de
atenção até certo nível, e quando executamos tarefas árduas, ignorar o que está
à nossa volta é fundamental.
Para Richard Wiseman, professor de psicologia da Universidade de
Hertfordshire, o processamento da visualização humana "é enormemente
complicado".
"Grandes partes do cérebro são dedicadas a essa função. É
muito difícil, então não queremos processar o que não é importante".
"É por essa razão que precisamos da cegueira não intencional. Do
contrário, não seríamos capazes de focar numa determinada tarefa", diz
ele.
Uma vez que o cérebro cria a ilusão de que está constantemente
monitorando tudo, alega o pesquisador, normalmente nos surpreendemos quando não
percebemos algo que beira o óbvio.
Para comprovar sua teoria, Wiseman deu nova roupagem a um teste
famoso de atenção seletiva, criado pelo cientista Daniel Simons, para
demonstrar quão facilmente deixamos de notar a presença de um gorila em um
vídeo.
Enquanto assistiam ao vídeo, os pesquisadores pediam que as
pessoas se concentrassem em outras coisas, como, por exemplo, quantas vezes uma
bola era passada entre pessoas jogando basquete.
Em outro experimento, Wiseman pediu às pessoas que se
concentrassem em um truque de cartas. Durante o truque, alguns itens ao fundo
mudavam de cor, mas poucos perceberam a mudança uma vez que estavam focados nas
cartas.
Segundo o especialista, pessoas criativas tendem a ter um
desempenho melhor nesse tipo de teste, enquanto indivíduos ansiosos ou muito
preocupados com a tarefa tendem a notar menos o que foge do seu centro de
atenção.
Wiseman acredita que há muitas ocasiões na vida em que não
percebemos "o óbvio" porque estamos totalmente focados em outros
problemas.
Um exemplo ocorre quando motoristas acabam atropelando pedestres
porque estavam prestando atenção em outra coisa (blogueiro enfiando a colher: será que é por isto que os acidentes costumam ocorrer quando estamos perto de casa?), ou pilotos de avião que
relatam não ter percebido as luzes de emergência na cabine porque estavam
ocupados com outros assuntos.
"Um adulto está constantemente aprendendo a julgar o que é
ou não é importante, então estamos mais propensos a cometer esses
deslizes", resume Wiseman.
Excelente matéria, útil e instrutiva. Como conhecer os meandros da mente humana e suas variáveis.
ResponderExcluirAntônio Carlos Faria Paz - Itapecerica/MG